No domingo de manhã, o FutureMD continuava no edifício sede da NOVA Medical School.
Bloco E
Pediatria
Carolina Filipe Cunha a apresentar a sessão sobre Pediatria, dia 6 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
O Bloco E começou com uma palestra sobre o internato de formação específica na área da Pediatria, dada pela Dra. Carolina Filipe Cunha do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca. A oradora foi acessível e sincera quanto às dificuldades da especialidade, mas notava-se estar genuinamente contente com a sua escolha.
A Pediatria é uma especialidade com urgência e que a Dra. Carolina classificou como desafiante, pois há muitos conhecimentos que não são transmitidos na faculdade. No entanto, é muito estimulante, pois a abordagem muda drasticamente de doente para doente.
A formação é de 5 anos, constituindo os primeiros três anos o Treino Pediátrico Básico. O 4º e 5º anos são de treino nas áreas diferenciadas da Pediatria. Há objetivos a cumprir ao longo dos cinco anos, nomeadamente publicações científicas, apresentações e presença em congressos e estágios no estrangeiro. Os congressos estão associados a um ponto negativo da especialidade que a Dra. Carolina destaca. As despesas de inscrição nestes eventos e a logística associada é responsabilidade total do médico interno, uma vez que a indústria não financia a participação dos médicos, ao contrário de outras especialidades.
Em relação ao horário, este conta com muitas horas de trabalho extra, especialmente urgências. Apesar de cansativo, isto depois também tem um impacto no vencimento ao final do mês. Além das horas extraordinárias fatigantes, outra grande desvantagem prende-se com os diagnósticos. Diagnosticar doenças crónicas em idades pediátricas é certamente duro psicologicamente para muitos. No entanto, para quem gosta do raciocínio clínico, a Pediatria é uma boa especialidade pois recorre pouco a meios complementares de diagnóstico e terapêutica.
A Dra. Carolina foi sempre muito comunicativa e retratou a Pediatria como um caminho bastante trabalhoso e árduo. Quem valoriza a qualidade de vida durante os anos do internato talvez fique desanimado com as horas semanais de trabalho de Pediatria. Mas o seu gosto pela especialidade era visível e deixou claro que o dia-a-dia é entusiasmante e variado.
Medicina Geral e Familiar
Catarina Capella a apresentar a sessão sobre Medicina Geral e Familiar, dia 6 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
À palestra de Pediatria, seguiu-se outra especialidade generalista: Medicina Geral e Familiar, apresentada pela Dra. Catarina Capella, médica de família da USF Mónicas e USF São José.
Numa primeira parte, explicou como se organizava o internato. É uma formação de 4 anos, dividida entre MGF1, MGF2 e MGF3. No 1º ano, há pouca autonomia, com passagem pelo SU de Cirurgia e Ortopedia. Há ainda formações curtas ao longo deste ano, que é a totalidade do módulo MGF1. O MGF2 é constituído pelo 2º e 3º ano, no qual se percorrem as áreas da Saúde Infantil e Juvenil, Saúde Mental e Saúde da Mulher. É durante estes dois anos que se realizam as formações opcionais e mais formações curtas. Há também horas destinadas a SU de Medicina Interna. O último módulo, MGF3, é feito no 4º ano e é dedicado a formações curtas. Uma vantagem do internato é a possibilidade de o personalizar, através da formação opcional e das formações curtas.
Em relação à avaliação, é realizado um exame todos os anos e ainda um exame de saída, onde é avaliado conhecimento teórico e prático e ainda o CV. Alguns internatos são mais exigentes do que outros no que diz respeito à construção de currículo ao longo dos anos de especialização. Não é propriamente o caso de Medicina Geral e Familiar. É possível terminar o internato sem fazer currículo, no entanto isto vai-se refletir numa pior nota final.
O percurso em MGF pode passar por outras atividades para lá do currículo-tipo do internato. A realização de estágios no estrangeiro é uma mais-valia e é muito facilitada. Há também a possibilidade de complementar estudos com pós-graduações, mestrados e PhDs, bem como subespecializar-se após a conclusão da formação específica.
Numa altura em que os futuros médicos valorizam cada vez mais a qualidade de vida aquando da escolha de uma especialidade, a Medicina Geral e Familiar é vantajosa. O horário durante a semana é caótico. No entanto, os fins de semana são livres. Pode-se ainda adicionar outras atividades, como consultas no privado e SU, que aumentam inevitavelmente o vencimento.
Quanto à remuneração, esta varia consoante a unidade em que se está e os indicadores da mesma. Os indicadores são como objetivos para cada unidade, que quando cumpridos, implicam um bónus no salário dos profissionais. Numa USF B com bons indicadores, o vencimento fica entre os 3500 e 4000€ limpos por mês, como especialista.
Por fim, a Dra. Catarina apresentou aquelas que, na sua visão, são as vantagens e desvantagens da especialidade. O primeiro ponto negativo que destacou foi a forma como a especialidade é ainda vista, como o “patinho feio” da Medicina, para onde vai quem não tem acesso a mais vagas. Para além disso, o horário, apesar de desafogado, conta com muita carga assistencial, que não é o trabalho mais interessante. A última desvantagem prende-se com a ausência de horas extraordinárias, que tem o seu lado positivo, mas que pode ser uma limitação para quem pretenda receber mais com elas.
A Medicina Geral e Familiar oferece algo que muitas especialidades em Portugal ainda não oferecem, que é uma boa qualidade de vida e uma quantidade de trabalho que não é excessiva. A Dra. Catarina mostrou-nos que o percurso pode ser diversificado, tanto no internato com estágios opcionais e no estrangeiro e também com as formações curtas, bem como com a possibilidade de realizar subespecializações e competências. A especialidade apresenta múltiplas vantagens e esta palestra certamente contribuiu para uma maior divulgação das mesmas.
Medicina do Trabalho
Salomé Camarinha a apresentar a sessão sobre Medicina do Trabalho, dia 6 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
A Medicina Geral e Familiar deixa todos os anos vagas de internato por preencher. Ainda assim, entre os jovens estudantes de medicina nota-se um interesse crescente na área. O mesmo não se pode dizer da especialidade que se seguiu, sobre a qual pouco se fala. Mais uma vez, aqui se viu que o Future MD fez de facto um esforço por trazer aos estudantes realidades pouco exploradas e conhecidas. A Medicina do Trabalho é uma especialidade recente e poucas pessoas a consideram. Por isso, a palestra da Dra. Salomé Camarinha foi útil para nos aproximar a uma área que é pouco ou nada abordada ao longo do curso e que pode ser de interesse.
O internato de Medicina do Trabalho é de 4 anos. O primeiro ano é dividido entre Medicina do Trabalho e Medicina Interna, onde os internos trabalham como se fossem internos de Medicina Interna. No 2º, 3º e 4º anos, fazem-se estágios obrigatórios e opcionais, sendo os últimos 9 meses dedicados à Medicina do Trabalho em meio hospitalar. Ao longo dos quatro anos, é necessário fazer uma formação teórica. Esta pode ser feita em qualquer altura do internato, mas costuma ser feita logo no primeiro ano, para dar bases nestas matérias que são pouco abordadas no curso. Há ainda a possibilidade de realizar estágios no estrangeiro, que são valorizados. A formação em Portugal ainda está pouco desenvolvida por ser uma área recente, por isso é uma mais-valia complementar o internato com experiências internacionais.
O dia-a-dia em Medicina do Trabalho é predominantemente composto por exames de Medicina do Trabalho, semelhante a consultas, e não se realiza SU. Esta era a principal vantagem da especialidade que a Dra. Salomé indicava. Por ser uma área ainda em desenvolvimento, tem a grande desvantagem de haver poucos recursos bibliográficos e guidelines. Para além disso, os médicos devem possuir um conhecimento altamente específico e técnico, ao mesmo tempo que devem dominar a medicina generalista. O médico de Medicina do Trabalho deve ainda evitar exercer uma medicina curativa, não devendo, por exemplo, prescrever fármacos, o que pode ser um obstáculo para alguns. Estes médicos sofrem também uma grande falta de reconhecimento, que naturalmente é uma desvantagem da especialidade.
A Medicina do Trabalho talvez não seja a especialidade mais interessante para a maioria dos estudantes de medicina, mas não deixa de ser importante conhecê-la. Os aspetos positivos apresentados pela Dra. Salomé não foram especialmente aliciantes e talvez por isso esta palestra não tenha sido a mais convincente. Ainda assim, foi vantajosa na ótica de aproximar os estudantes de uma realidade pouco falada e abordada no curso.
Pedopsiquiatria
Beatriz Fernandes Figueiredo a apresentar a sessão sobre Pedopsiquiatria, dia 6 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
As últimas palestras do dia focavam-se na saúde mental. Para abordar a especialidade de Pedopsiquiatria, recebemos a Dra. Beatriz Fernandes Figueiredo. A oradora foi excelente em esclarecer as especificidades desta especialidade de uma forma bastante acessível.
Começou por definir a Pedopsiquiatria e de que forma se distingue da Pediatria e da Psiquiatria. A Pedopsiquiatria “tem como objetivo prevenir, diagnosticar e tratar crianças e jovens cujo crescimento e desenvolvimento psicoafetivo tenha sido impactado, de forma temporária ou permanente, por fatores que condicionam as suas emoções, os seus comportamentos ou a capacidade de socializar.” Distingue-se da Psiquiatria por ter mais em conta o contexto familiar e usar os pais como co-terapeutas. Por sua vez, é diferente da Pediatria pois “avalia o estado mental, conhece os processos do desenvolvimento psicoafetivo da criança e do adolescente e atenta nas relações interpessoais e dinâmicas familiares”.
Ao apresentar as vantagens desta especialidade, a Dra. Beatriz destaca em primeiro a menor carga de urgências. Outro benefício do horário é ser apenas diurno. É também positivo haver espaço para construir relações de proximidade com o doente e possibilitar-se uma aprendizagem constante, sem qualquer monotonia na prática do dia-a-dia. O internato permite ainda haver espaço para a vida pessoal e existe um clima de baixa competitividade.
De uma maneira franca, a Dra. Beatriz apresentou algumas adversidades da especialidade. No início do internato, pouco se sabe desta área e começar do zero pode ser menos encantador. Para além disso, os casos por vezes são difíceis e isso naturalmente impacta negativamente o médico. Associada a isto, vem a frustração de não se conseguir alterar o contexto dos doentes, que muitas vezes tem uma grande influência no bem estar. À semelhança da Pediatria, esta área é pouco apoiada pela indústria no que diz respeito a formações e congressos. O custo da formação é uma dificuldade do interno de Pedopsiquiatria. A última desvantagem que a Dra. Beatriz nomeia prende-se com a duração das consultas, que por serem demoradas, não são tão rentáveis como nas outras especialidades.
O internato tem a duração de 5 anos. Três destes anos são dedicados à Psiquiatria da Infância e da Adolescência. Há ainda um estágio de 12 meses em Psiquiatria do adulto e um de 6 meses em Pediatria.
Ficámos a conhecer melhor a abordagem de um pedopsiquiatra quando a Dra. Beatriz nos trouxe vários casos concretos de doentes seus. Mostrou desenhos das crianças, desenhos estes que são interpretados pelos médicos e que são uma forma de comunicação do doente para o médico. Outras estratégias integram brinquedos e são igualmente úteis para chegar ao doente e ajudá-lo.
A Dra. Beatriz trabalha também no sistema privado e, por isso, foi capaz de nos transmitir como é esta realidade. Por norma, o contexto social destas crianças é mais favorável e as famílias têm mais recursos para os ajudar. Desta forma, os casos são, à partida, menos complexos, o que se traduz num menor desgaste emocional do profissional. Tem ainda a vantagem de ser um bom complemento ao ordenado do público. A duração longa das consultas voltou a ser apresentada como uma desvantagem, uma vez que se paga à consulta e nesta especialidade faz-se menos consultas por hora. Para além disso, há pouco trabalho de equipa no sistema privado.
A Dra. Beatriz foi especialmente acessível e honesta quanto aos pontos positivos e negativos da Pedopsiquiatria. Foi também uma excelente ideia mostrar-nos exemplos concretos da sua prática clínica, que foram bastante esclarecedores.
Psiquiatria
Bruno Vidal a apresentar a sessão Psiquiatria, dia 6 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
Das crianças passámos para os adultos. O Dr. Bruno Vidal, interno do 3º ano, foi o orador da última palestra deste bloco, sobre Psiquiatria. Para o Dr. Bruno, a Psiquiatria é onde a verdadeira abordagem biopsicossocial é posta em prática. A entrevista clínica é a principal arma clínica, usando, ainda assim, meios complementares de diagnóstico e terapêutica para excluir causas não psiquiátricas e orientar a terapêutica. Nesta área, a relação terapêutica é de grande importância, bem como certos aspetos legais.
Ao longo da palestra, acentuou que a Psiquiatria é uma área muito vasta com múltiplos contextos possíveis de intervenção, entre eles a subespecialidade de Psiquiatria Forense e as competências de Sexologia e Perturbações Aditivas. A intervenção passa pela consulta externa, internamento e urgência, mas também locais como estabelecimentos prisionais e áreas de vanguarda como os psicadélicos.
O internato tem a duração de 5 anos, com 48 meses de estágio de formação em Psiquiatria, que aborda a Psiquiatria Geral, as Perturbações da Adição e a Psiquiatria Geriátrica, entre outros. Os estágios opcionais completam 6 meses da formação, que conta ainda com outros dois estágios, em Neurologia e Psiquiatria da Infância e da Adolescência, ambos de 3 meses.
À semelhança das especialidades anteriores, o apoio da indústria farmacêutica para a formação dos médicos é escasso. A formação em Psicoterapias, os congressos e eventos científicos e as pós-graduações são despesas que ficam totalmente a cargo do interno. É ainda expectável do interno de Psiquiatria a apresentação de posters em congressos nacionais e internacionais e a publicação de artigos, capítulos de livros ou mesmo livros completos.
Por último, o Dr. Bruno apresentou as suas razões pessoais para ter escolhido a especialidade de Psiquiatria. Destaca o bom equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Foi também aliciado pela variedade de contextos de intervenção da especialidades e a possibilidade de realizar subespecialidades. Salienta ainda ser uma área desafiante e de grande potencial, onde a necessidade de um trabalho multidisciplinar é grande.
A especialidade de Psiquiatria apresenta um bom equilíbrio entre a vida laboral e profissional e um dia-a-dia e áreas de atuação muitíssimo variadas. Talvez por isso tenha sido cada vez mais procurada e tem-se tornado mais difícil entrar no internato. O Dr. Bruno apresentou-nos com clareza a estrutura da formação e foi bem-sucedido em fazer um retrato apelativo da especialidade.
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