O Future MD 7.0 ocorreu de 4 a 6 de abril de 2025, no Auditório António Domingues de Azevedo e no Edifício Sede da NOVA Medical School. É um congresso direcionado a todos os estudantes do Mestrado Integrado em Medicina do país e também aos Internos de Formação Geral. O objetivo é dar a conhecer as carreiras a que a formação em Medicina dá acesso, desde a via clínica mais convencional a percursos alternativos menos óbvios. Conta também com a partilha da experiência de internato no estrangeiro por colegas que optaram por fazer a formação específica lá fora.
Entre a Lei e a Saúde
Miguel Guimarães a apresentar a sessão Entre a Lei e a Saúde, dia 4 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
O congresso abriu com as palavras da diretora da NOVA Medical School, a Dra. Helena Canhão. Escutámos ainda dois colegas, o presidente da AENMS Diogo Oliveira e a coordenadora do congresso FutureMD Inês Grilo. Depois dos discursos de abertura, o Dr. Miguel Guimarães abriu o programa de palestras. Licenciado em Medicina pela FMUP, é atualmente deputado da Assembleia da República pelo PSD. Falou-nos do papel de um médico na esfera política, Entre a Lei e a Saúde.
Para o Dr. Miguel, o médico tem um papel determinante na política portuguesa porque traz consigo um conhecimento técnico que muitos não têm. Assegurou que todos podemos ter um impacto direto e indireto nas políticas de saúde do país, através de associações de estudantes, da Ordem dos Médicos, sociedades científicas, entre outros.
Reforçou que os médicos são essenciais na formulação de políticas de saúde, pois eles estão no terreno, sabendo melhor do que ninguém o que falta e por onde melhorar. Por cativarem mais os profissionais de saúde para objetivos concretos, o Dr. Miguel afirma que os médicos à frente das instituições conseguem obter melhores resultados, por oposição às instituições na área da saúde que são lideradas por profissionais não médicos.
Já quase no final, destacou quatro áreas emergentes dos dias de hoje no que toca ao papel da política na Saúde: a Inteligência Artificial juntamente com a telemedicina, a Saúde e mudanças climáticas, o financiamento do SNS e a participação dos médicos na elaboração de leis. Para rematar, afirmou que a medicina e a política não são mundos separados, pois ambas partilham o objetivo de construir uma sociedade mais justa e saudável.
A palestra do Dr. Miguel não foi acompanhada por suporte visual, que certamente teria sido um acrescento positivo. Ainda assim, o discurso foi atual e o orador soube adaptá-lo ao público. Falou para uma plateia jovem de estudantes de medicina e era claro nas suas palavras que tinha isso presente nas suas palavras.
Formação Médica no Estrangeiro – Suécia
Rita Ferrito a apresentar a sessão Formação Médica na Suécia, dia 4 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
Após as palavras do Dr. Miguel, a sessão Clinicamente Falando introduziu-nos ao mundo das clínicas privadas. Seguiu-se o coffee break e logo depois fomos até ao norte da Europa, conhecer a Formação Médica na Suécia, onde a Dra. Rita Ferrito se especializa em Urologia. Muito carismática, a Dra. Rita foi a escolha acertada se o objetivo era convencer os ouvintes a ir também para a este país. Muito acessível e com um espírito bastante vivaz, notava-se que estava genuinamente encantada com o país escandinavo.
Começou por elencar as três principais razões para se ter mudado para a Escandinávia. Salientou a boa qualidade do sistema de saúde e a boa remuneração de um médico. Uma outra razão residia no equilíbrio que encontrou em Estocolmo entre ser de facto uma cidade, com vida social e festas, mas também ter muita natureza e imensa água.
Na Suécia, o sistema de saúde é maioritariamente público, não obstante existindo clínicas privadas com apoio do Estado. As patologias e os procedimentos costumam estar centralizados nas grandes cidades e centros, como que unidades subespecializadas. Por exemplo, todas as cistectomias do país são feitas ou num hospital em Estocolmo ou noutro em Gotemburgo. Isto acaba por ser uma desvantagem para quem quer um dia-a-dia com uma grande variedade de patologias.
Para preparar a mudança, a Dra. Rita deixou quatro pontos que devem ser percorridos antes de partir. Aprender sueco até ao nível C1 é obrigatório para trabalhar como médico na Suécia. Visitar o país é também importante e pelo menos duas vezes, uma no verão e outra no inverno. As estações na Suécia são diferentes daquilo que é habitual em Portugal e a Dra. Rita diz que o país transforma-se por completo do inverno para o verão. A Dra. Rita aconselha também realizar estágios clínicos na Suécia (ex.: IFMSA), de forma a contactar de perto com os hospitais suecos. Deixou ainda a recomendação de consultar o site do Socialstyrelsen / National Board of Health and Welfare (socialstyrelsen.se), onde nos podemos informar mais acerca do processo.
O internato médico depende muito do interno. Há um conjunto de objetivos a cumprir e, com base nisso, os internos devem entrar em contacto diretamente com os hospitais para fazer as suas rotações. Cada interno tem ainda a responsabilidade de fazer tutoria de estudantes.
Em relação à remuneração, esta varia consoante o hospital e há margem para negociar o valor. Não existe subsídio de férias ou natal, mas a Dra. Rita assegura-nos, em tom cómico, que não vamos sentir falta do mesmo. Os impostos a pagar também variam consoante a zona da Suécia, por isso não há um valor líquido universal para médico interno. Cada médico tem direito a, pelo menos, 25 dias de férias e as horas extraordinárias são mais regulamentadas do que em Portugal. São proibidos bancos de mais de 12 horas seguidas e cada hora é paga no dobro ou triplo. A licença de maternidade estende-se por, pelo menos, 390 dias. Em geral, há um grande incentivo à vida fora do trabalho, à construção de família e contra o trabalho excessivo, que certamente torna a Suécia mais atrativa do que Portugal para quem valoriza estes fatores.
Mas nem tudo é benefícios e a Escandinávia tem fama de ser bastante mais cara do que Portugal, apesar dos salários mais elevados. No entanto, comparando os preços entre Lisboa e Estocolmo, podemos ser surpreendidos. Os transportes são muito mais caros na Suécia, mas os custos associados a um filho pequeno são muitíssimo mais elevados em Portugal. Há muitos gastos que são de facto mais elevados na Suécia, mas, em certas áreas, Portugal é notavelmente mais dispendioso. As rendas em Estocolmo e Lisboa encontram-se pelos mesmos valores, mas, em geral, o poder de compra na Suécia é de 114% do de Portugal.
Como principais aspetos positivos, a Dra. Rita salienta maior liberdade na escolha e troca da especialidade e, acima de tudo, o bom equilíbrio entre vida pessoal e profissional e uma remuneração que permite grande autonomia.
Menos positiva é a necessidade de aprender uma nova língua, língua esta que tem pouca utilidade fora da Suécia. Para quem prefere a estrutura, a pouca organização do internato pode também ser um obstáculo. A distância da família e amigos é também um ponto que pesa e deve ser considerado. Os últimos aspetos negativos que a Dra. Rita referiu foram o choque cultural e as horas de sol ao longo do ano, que são escassas no inverno e demasiadas no verão.
A palestra da Dra. Rita conquistou vários dos ouvintes, não só pelas excelentes condições laborais, mas também em grande parte pela desenvoltura, sinceridade e humor da palestrante. Apesar disto, estar longe da família e amigos, ter de aprender uma nova língua e habituar-se a um clima deveras distinto do de Portugal são questões que pesam.
Medicina Sem Sentença
Teresa Galhardo e Carla Pipa a apresentarem a sessão Medicina Sem Sentença, dia 4 de abril de 2025 no Future MD 7.0 | Créditos de imagem: Future MD
Da Suécia falou-se muito em liberdade e a sessão que se seguiu não podia ser mais diametralmente oposta. Se na Suécia há uma grande autonomia para cada um escolher o seu percurso, agora abordávamos a Medicina Sem Sentença. A Medicina em meio prisional é um tema sobre o qual os estudantes de Medicina sabem pouco. A palestra dada pela Dra. Teresa Galhardo e a Enfermeira Especialista Carla Pipa tinha grande potencial de ser das mais interessantes do congresso e de fazer a diferença ao introduzir os estudantes a temas até então ignotos.
No entanto, as oradoras focaram-seok fortemente nos números, leis e despachos relacionados com o meio prisional, o que foi pouco cativante. Teria sido talvez mais útil e aliciante partilharem como é o dia-a-dia de um profissional de saúde num estabelecimento prisional e as suas experiências pessoais. O que lhes toca mais no contacto com os reclusos? Quais as especificidades da abordagem médica em meio prisional face ao meio livre? Estas são apenas algumas questões centrais a este tema que ficaram longe de ser respondidas, o que fez das palavras da dupla pouco exitosas se o objetivo era dar a conhecer o trabalho neste meio.
Ainda assim, a palestra foi certamente bem-sucedida em consciencializar para as características da população em meio prisional. Os utentes em meio prisional sofrem de uma elevada carga de doença e envelhecimento precoce, sendo considerados idosos a partir dos 55 anos. Há também uma elevada prevalência de fatores de risco. Quase 70% dos reclusos consumiram alguma vez na vida substâncias psicoativas e há também uma grande incidência de consumo alcoólico excessivo prévio, bem como detenções por crimes relacionados com álcool, direta ou indiretamente. Esta população tem também uma elevada taxa de suicídio.
A oportunidade foi certamente mal aproveitada. O tema era interessante e desconhecido por muitos. Poderia ter sido uma ótima chance de introduzir os estudantes ao trabalho importantíssimo que é feito nestes estabelecimentos, mas os aspetos abordados não foram os melhores para fazer o retrato desta possível saída profissional. O primeiro dia do congresso encerrou com uma sessão que incidia sobre a Medicina Intensiva, onde Cada Segundo Conta.
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